quinta-feira, 6 de novembro de 2008

O punk guapo da De Los Tigres - "o punk ainda pode ser verdadeiro em sociedades falidas"

*torquato rocha

De Los Tigres é a mais nova banda que bruno bandido e Maestro (felipe), a dupla mais camaleônica da cidade, forma. Um legitimo punk. Mas será que ainda existe um legitimo punk? De acordo com bruno bandido sim: "o punk pode acontecer onde tiver que acontecer, cidades como jaguarão precisam de festa anárquica ao invés de hipocrisia disfarçada de política e hábitos sociais. É claro, o punk ainda pode ser verdadeiro em sociedades falidas".

O grande mérito da dupla é montar uma estética punk diferente da de Nova York ou a de Londres em 77 ou o do Brasil em 1980. Embora com influência presente destas três vertente do movimento, bandido e Maestro criam uma estética própria da fronteira do Rio Grande do Sul com o Uruguai e Argentina. Algumas músicas em portuñol, outras só em português, mas sempre deixando presente referências à região do Plata e do chimarrão.

De Los Tigres está em fase de composição e produção teórica e prática. Ainda não se apresentaram, mas já dá pra saber qual será o clima de quando ele subirem em um palco da cidade heróica.

A poesia punk que bruno bandido faz é debochada, direta e sarcástica, deixa clara a proposta da banda. na música "vira-latas da cidade" ele faz a analogia entre os cachorros de rua que existem aos montes em Jaguarão e os seus próprios amigos e integrantes da contraculturajaguarense. Também existem críticas políticas - como em "eu não servi às forças armadas" - e sociais - como em "prendinhas piradas" referência ao CTG e sociedade dominante da cidade. As mais importantes, pois pregam a ideologia de anarquismo e libertinagem da banda, são:

1 - indecência: um diálogo debochado que bandido estabelece com duas canções punks brasileiras. a primeira e mais direta é com "independência" da banda Capital Inicial. a segunda é sutil e engraçada, ele conversa através de um verso com Renato Russo, na música índios da Legião Urbana. nela, Renato canta "quem me dera ao menos uma vez (...) não ser atacado por ser inocente", onde o poeta de Brasília faz um protesto a nível nacional político-social-jurídico. já bruno bandido optou pela libertinagem e anarquia (o que é bem mais punk). então ele solta a frase aos gritos no final da canção: "quem me dera ao menos uma vez não ser atacado por ser indecente".

2 - anarchia en jaguarão: é uma versão em portuñol de "Anarchy in The UK" dos Sex Pistols. a música retrata bem a idéia de não copiar a rebeldia londrina dos Pistols e sim adaptá-la ao ambiente em que se produz arte.

3 - puerra: é o hino da De Los Tigres! é nela que bandido grita a plenos pulmões 'BAILEM PUTOS!' e todos cantam em uníssono o palavrão brasileiro com sotaque em espanhol "puerra". segue parte da letra aí embaixo.

"
puerra
yo solo quiero sexo
yo no no quiero mierda
yo solo quero bailar

puerra
yo solo quiero fiesta
yo no no quiero guerra
yo solo quiero bailar

y cuando salio en la calle
salio en la calle
no me encontro más
no me encontro más
...
"

Estes versos deixam claro que a ideologia é anárquica em suma. Quando a música diz "Yo so lo quiero bailar", podemos, facilmente, notar a presença de um grande nome do anarquismo teórico, a lituana Emma Goldman. É dela a clássica frase: "Se não posso bailar, não me interessa tua revolução" (tradução livre).

As melodias das canções são de uma originalidade que mistura nuances dos Sex Pistols Ramones e Stooges, cantos de torcidas de futebol e regionalismo latino-americano. De acordo com bruno bandido: "A receita certa para uma verdadeira sopa punk gaudéria".

Para trabalhar mais no seu som, que eu classifico como um "punk guapo", bandido e Maestro chamaram um baixista da serra gaúcha: Ricardo Ara, direto da cidade de Carlos Barbosa. A De Los Tigres ainda não possui um baterista fixo, mas promete resolver logo o problema. Em fase ainda de começo e pré-show, eles decidem o que tocarão de clássicos punks e já possuem um repertório próprio invejável e criativo:

- Puerra!
- indecência
- eu não servi às forças armadas
- prendinhas piradas
- vira-latas da cidade
- o amor é um cão dos diabos
- anarchia en jaguarão

De dar água na boca e dor nos ouvidos. Uma boa dor nos ouvidos. E pra quem quer saber esse nome, Maestro (felipe) explica: " Existiu um carroceiro folclórico em Jaguarão, quando ele passava pelas ruas com sua família em cima da carroça e alguma criança gritava pra ele 'De los tigres', ele descia furioso e era capaz de bater em quem gritou". Aposto que quem tem pelo menos 18 anos e é de Jaguarão lembra dessa figura violenta, que quando chamado pelo seu apelido realmente virava uma fera. O porquê disso talvez ninguém saiba. Mas combina com a proposta de mistura do punk com a cultura da fronteira dos guris. Acertaram até no nome.

O que nos resta é esperar. E estar preparado para ouvir e ver, de acordo com bandido:

- um puro punk chê del plata. com acordes baguais, uísque na biqueira, fogo no rincão, festa na cidade, danças desengonçadas e bombachas rasgadas. trocaremos os chicotes gaudérios que batem nos cavalos por chicotes finos e pretos de sado-masoquismo a la lou reed. olé!




*torquato rocha é filósofo e poeta pedreiro. quando está bêbado escreve ensaios sobre a contraculturajaguarense.